segunda-feira, 7 de março de 2022

costelinha e o mendigo _^_ branco



o mendigo está dormindo no banco da praça
coberto por pedaços de papelão e restos de cobertores velhos
sob o banco 
costelinha também dorme — enrodilhado  
companheiros inseparáveis
de feridas
de fome
de jornada

e o mendigo sonha

mil sóis o aquecem
do frio da noite
a lua reflete-se em prata
no orvalho em seus cabelos
estrelas atentas 
velam pelo seu sono — e o do seu amigo  
anjos colocam comida
na velha lata de marmelada 
que ele usa como prato

e então

ele flutua pela eternidade
seus olhos conseguem perceber
as maravilhas disfarçadas em dia a dia
existe tanta paz e plenitude —  em seu sonhar  
que Deus desce de sua nuvem preferida
— aquela com formato de mãe - 
e aproximando-se
afaga a sua cabeça
lembrando-se do dia em que 
Lhe deu como presente
a sabedoria do faz de conta
e Sorriu satisfeito por ter feito isso
costelinha — sempre presente  
está em festa e abana freneticamente o rabo
bagunçando Sua alva e bela túnica
e o mendigo se faz luz
costelinha se faz luz
e por um momento fugaz
criador e criaturas são apenas um
e todo o sentido do mundo se mostra — sem véus 
e uma pomba pousa no invisível fio do infinito

repentinamente

o mendigo é acordado — aos safanões  
pelo guarda da praça
costelinha se põe em alerta e rosna
o mendigo percebe que amanheceu
senta-se no banco
sacode a cabeça
tentando se lembrar de onde está
respira fundo
tira do bolso um naco de pão mofado
— que é dividido com o amigo  
e sentindo-se abençoado
segue — seguido por 4 patas  
para lugar nenhum
deixando atrás de si
o cheiro que incomoda
todos aqueles que não sonham mais




ilustração ;the beggar and the dog (domínio publico)

© 2022 do autor
℗ house of lord


 

25 comentários:

Salete Ortiz disse...

Uma poesia visual. Me senti sonhando junto com o mendigo, como sempre um presente para nós.

Anônimo disse...

Que coisa linda.

Vera Priante disse...

Nossa, eu amei... Viajei junto com eles...

Carla Dias disse...

O que um olhar não faz...
Não dá pra melhorar o mundo assim, direto. É preciso melhorar o olhar, enxergar.
Lindeza, Branco.

Nádia Coldebella disse...

Oi Branco!
Vc encontrou um jeito romântico e bastante lírico de se olhar para uma mazela... Quem dera a dureza do mundo pudesse ser sentida assim!
Uma poesia bastante imagética, que complementa muito bem o lirismo que vc traz!
Abço

Débora disse...

Benditos são aqueles que enxergam os invisíveis... não para criticar ou reclamar, mas simplesmente como um ser humano "enxergando" outro...

José Carlos Moraes disse...

Senti no final da poesia um otimismo contagiante. Meu dia ficou mais leve.

Alexandre Silva disse...

Belo texto, estou com os olho marejado, e um coração confuso.

Daniela Lara disse...

Há muito mais do que bens materiais, do conforto ou de conquistar o mundo. É este essencial que dá força para sonhar, se levantar e seguir em frente, apesar de tantas contrariedades. Muito lindo e muito sutil.

Carol Brás disse...

A vida é assim infelizmente a maioria das pessoas são guardas de praça ou os incomodados. Belíssimo!

Anônimo disse...

Nossa...sensacional...vc como sempre...o poeta da vida...parabéns

Camilian disse...

Lindo pai, como sempre encontrando palavras doces para retratar rotinas amargas. Obrigada por proporcionar essa leitura.

André Ferrer disse...

Excelente Lord!

Carlos Eduardo disse...

Uma viagem a ser feita entre os personagens e o leitor. Bravo!

Unknown disse...

Quem tiver olhos de ver, verá! Muito bom, amigo.

Anônimo disse...

Lindissimo! Acho que é exatamente isso que acontece com a maioria das pessoas. Adorei...

Albir disse...

Sua poesia nos consola até da tristeza alheia!

Mauro Barbieri disse...

Vi este mesmo quadro na Praça Santa Terezinha. O interessante é a situação contada por você, de forma poética, que me fez ver além da situação que vi e senti. Pura realidade. Parabéns!

Walter Rodrigues disse...

Os "invisíveis" também sonham. Obrigado pela viagem meu irmão! Valeu! Abração.

Zoraya Cesar disse...

Quanta tristeza cabe em tanta beleza! E só um poeta de altíssima sensibilidade para levar leveza e encantamento aonde só haveria desencanto. Obrigada por escrever e compartilhar, oh, My Lord white!

Anônimo disse...

Muito lindo consegui até imaginar o sonho junto c o mendigo e o costelinha��

Unknown disse...
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Unknown disse...

Mto bem feito,gostei, emocionante. Parabéns,.
Acima saiu escrito errado desculpa

Rosana disse...

Que lindo. Por instantes ele saiu da dureza da vida e pode sonhar livremente! Adorei! ����

Sandra Modesto disse...

Sensível e real. Belíssimo texto.