tudo
é fétido
07
da manhã
o
despertador toca
o
cadáver se levanta
escova
os dentes
espreme
os vermes
que
estão sob a pele
penteia
os cabelos
faz
o café
toma
o café
o
cadáver
vai
para o trabalho
tudo
é indiferente
tudo
é insosso
tudo
é desimportante
para
o cadáver
12
horas
no
pulso
o
cadáver vai
até
o restaurante
olhas
as pessoas
não
as percebe
enche
seu prato
come
arrota
sai
dali
17
horas
o
apito avisa
o
cadáver vai ao supermercado
pega
aleatoriamente
latas
vidros
sacos
caixinhas
paga
sai
dali
na
rua
as
luzes dos postes
se
acendem
iluminando
fracamente
a
bizarra silhueta
de
um cadáver
com
sacolas plásticas
balançando
em suas mãos
entra
em sua casa
19
horas
o
relógio na parede
o
cadáver faz seu jantar
mexe
na panela
frigideira
faca
garfo
prato
e
copo
come
arrota
limpa
a boca
no
sujo
pano
de prato
sai
dali
20
horas
na
televisão
o
cadáver olha as imagens
impassível
desliga
a tv
vai
ao banheiro
mija
toma
banho
alguns
vermes
somem
pelo ralo
escova
os dentes
penteia
os cabelos
sai
dali
22
horas
no
sino da igreja
o
cadáver vai para o quarto
coloca
o pijama
deita-se
antes
de dormir
a
rotina
que
o assombra
há
anos
e o
cadáver aguarda
como
em todas
as
noites anteriores
que
ao amanhecer
seu
corpo atinja
a temperatura
ambiente
o
cadáver dorme
não
sonha
37ºC